Ele aniversaria na estrada, e amanhã
canta em Afogados da Ingazeira
Alceu Valença, sem enquadramento
Foto: divulgação
José Teles
teles@jc.com.br
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Alceu Valença trouxe isso tudo que viveu
em São Bento do Una quando veio para a capital estudar o que fazia parte do
figurino dos filhos de famílias abonadas do interior. O pai o queria doutor,
mas Alceu Valença tinha outros planos: "Virei jogador de basquetebol.
Viajei muito pelo Brasil, e deixei de ir pro cinema. Tinha um cara na seleção,
Mosquito, com um metro e oitenta e seis senti um micróbio. Deixei o basquete.
Fui expulso do (Colégio) Nóbrega, consegui voltar, e fiz o curso clássico.
Com 14 anos, meu tio Lívio e meu pai, me
incentivavam pra ler literatura brasileira, toda literatura regional, Jorge
Amado, Graciliano Ramos, José Lins do Rego. Então inventei de ser
intelectual", recorda. Como intelectual, Alceu Valença redescobriu a
paixão pelo cinema, enquanto as meninas do Recife descobriram que ele se
parecia com Jean Paul Belmondo, o ator que transgrediu as regras hollywoodianas
de beleza, o feio considerado bonito: "Ai aconteceu a nouvelle vague e eu
era muito parecido com Jean Paul Belmondo, ele jogava box e tinha nariz
quebrado. Meu nariz não era quebrado, mas parecia um artista de cinema. Então
as meninas começaram a dar em cima de mim. Passei a fumar por causa de Jean
Paul Belmondo, vendo os filmes de François Truffaut e Jean Luc Goddard, sobretudo
os que tivesse Jean Paul Belmondo. Curioso é que a morte de Jean Paul Belmondo,
em Acossado, de Godard, acontece na frente do teatro onde fiz meu primeiro show
em Paris, em 1979.
Em 1968, o país fervia politicamente o
futuro astro da música popular brasileira tornarase acadêmico de Direito, um
dos cursos em que os estudantes eram mais politizados: "Deixei de ir ao
cinema porque o negócio era política. Tomamos o diretório de Direito da
direita. Durante o curso fui para a Universidade de Harvard nos Estados Unidos,
quem também esteve lá comigo foi Zé Paulo Cavalcanti". Em Boston,
Massachusetts, a bagagem cultural amealhada nos anos em que viveu em São Bento
do Una afloraram, e Alceu Valença descobriuse cantor e compositor:
"Cantava numa praça quando passou um jornalista e perguntou o que era
aquilo. Disse que música de protesto. Neste momento, eu que não pensava em ser
cantor, comecei a ser cantor. Aí volto pra cá, passei a fazer show, tocando
minha música".
O
PAI DE ALCEU
Doutor Décio Valença, que foi prefeito
de São Bento do Una, deputado da Constituinte de 1946, promotor público e
procurador do Estado, não queria filho artista. Demorou aceitar, mas acabou
aceitando, nos conforme do ditado: "Aquilo que não tem remédio remediado
está". Quando o filho tornara-se irremediavelmente famoso, até exercitou
a veia poética com uma quadrinha famosa na família Valença: "Quando sou
apresentado/ como agora aconteceu/ sinto que o meu pobre nome antes de mim já
morreu/ cada vez sou menos Décio/ cada vez mais pai de Alceu".
"Faço o que eu quero, do jeito que
eu quero, sabe por que? Tudo meu foi desta maneira. Com a música foi desta
maneira, não queriam que eu fosse artista, cantor. Depois sofri muito bullying.
Na época dos tropicalistas, perguntavam o que eu fazia. Eu dizia: faço música.
Vamos fazer a música universal? Não, eu faço o que eu quero. Faço meus discos
do jeito que quero, eu não pareço é com ninguém, eu sou eu e o boi não lambe.
Ninguém manda em mim. Sou como meu pai", avisa o rebelde filho do doutor
Décio Valença, que inteira 70 anos e deve ir pra muito mais. A mãe dona Adelma,
está com 102, e o pai dela, Adalberto Oliveira de Paiva, em 1976, celebrou os
90 anos lançando uma plaquete com a história da brava São Bento do Una.
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